Cynthia Levitan es Doctora en Diseño por la FBAUP – Universidad de Oporto, con una destacada carrera como escultora y cineasta en el campo de la animación. Cynthia ha creado una impresionante variedad de obras, entre las que se incluyen cortometrajes, esculturas e instalaciones. Además de sus actividades artísticas, Cynthia participa activamente en la educación superior como profesora e investigadora.
— A primeira imagem são essas campainhas com os nomes Teresa, Pierre... por que essa primeira imagem? É um convite para entrar no edifício e conhecer os personagens? Você pensou que a primeira imagem fosse a da campainha com os nomes, já que os nomes são algo importante?
A primeira imagem, com as campainhas e os nomes, funciona como um convite para entrar, o limiar entre o público e o íntimo, uma forma de introduzir os personagens de maneira gradual. Como o filme não tem falas, essa foi a maneira de apresentá-los desde o início através dos nomes, que representam a nossa primeira identidade, aquela que nos é dada antes mesmo de escolhermos quem somos. Ao longo do curta, a mudança de nome da personagem reflete sua transformação interior e o ato simbólico de se (re)nomear. Entre as campainhas, além dos nomes das protagonistas, há também a do “AL”, referência aos alojamentos locais, uma pequena provocação ao problema contemporâneo da habitação e à forma como as cidades se tornam espaços de passagem, onde os turistas encontram lugar, mas os moradores o perdem.
— Teresa tem na prateleira linhas e Pietra fotografias na parede. Threads são uma metáfora das coisas que podem ser consertadas? As fotografias um lembrete de quem você era e quem é atualmente?
— A flor vermelha e chamativa em um capacho marrom apagado e sem saber quem é a pessoa que a deixou — a cor vermelha nas flores pode significar valentia e força, mas também respeito e admiração. Você acha que Pietra sente admiração por sua vizinha e respeito? Ou quer uma trégua com ela?
A flor vermelha é, na verdade, um cravo, símbolo da Revolução dos Cravos em Portugal, um marco histórico de liberdade. No filme, ela representa uma nova revolução: a do corpo. É um gesto simbólico de libertação, tanto para Teresa, uma mulher mais velha que enfrenta as limitações impostas pela idade, quanto para Pietra, que reivindica a liberdade de ser quem é. O cravo é também um ato de amor próprio. Pietra oferece as flores à mulher amada, ela mesma, num gesto de aceitação e reconciliação com a própria identidade. Mas é igualmente um ato de amor ao próximo: ao deixar a flor na porta da vizinha, transforma esse gesto em uma tentativa de paz, uma forma delicada de apaziguar o conflito constante pelo barulho. Mesmo sem reciprocidade, a ação revela o desejo genuíno de conexão, mostrando que, apesar da distância e das diferenças, Pietra ainda busca o encontro e acredita na empatia como forma de resistência
— Os espelhos são muito importantes no curta-metragem e a forma como as duas pessoas se olham é mágica. Pietra com ilusão versus tristeza e Teresa simplesmente odiando essa velhice. Você acha que Teresa se incomoda com a juventude de Pietra? Ou se incomoda com a solidão?
Os espelhos têm um papel essencial no curta, como metáfora da identidade e do modo como nos reconhecemos, e também da crueldade de sermos, tantas vezes, prisioneiras de imagens que nos dizem como “devemos” ser. Eles refletem não apenas o rosto, mas também o peso das expectativas, o medo do tempo e a delicadeza de quem tenta se reconciliar consigo mesma. Teresa não se incomoda com a juventude de Pietra, mas com as diferenças que as separam. É uma mulher moldada por outra época, mais contida e conservadora, enquanto Pietra é expressão de liberdade e afirmação. Apesar do contraste, acabam por se espelhar e se transformar: unem-se no feminino e na solidão que as atravessa. No fim, tornam-se o espelho uma da outra e, ao reconhecerem suas semelhanças no reflexo, encontram empatia e libertação.
— Gosto muito dessas marcas no teto de Teresa. Têm algum significado? Eu, não sei se estou me equivocando, mas cada marca no teto feita com a bengala significa o que acontece com muitas pessoas trans em sua vida: incompreensão, intolerância, agressões... é isso?
Obrigada por esse olhar tão atento e sensível, é exatamente isso! As marcas no teto representam justamente essas cicatrizes invisíveis deixadas pela intolerância e pela incompreensão. São feridas que se acumulam com o tempo, mas também sinais de resistência, de alguém que continua ali, presente, apesar de tudo. E, claro, há também um toque de ironia: as marcas vêm de uma vizinha que reclama bastante, hehe. Gosto dessa mistura entre o simbólico e o banal, onde até um gesto cotidiano pode revelar camadas mais profundas de violência e de humanidade.
— Adorei como há outros objetos no curta-metragem que são relevantes e desconhecemos o motivo até o final, tais como: essa chave deixada na mesinha, essa câmera fotográfica e até mesmo as flores vermelhas. Por que esses objetos e não outros?
Cada objeto no curta foi escolhido com cuidado. A chave, a câmera e as flores funcionam como pequenas pistas, elementos silenciosos que só revelam seu verdadeiro significado com o desenrolar da história.A chave representa abertura e encerramento, o acesso a um espaço íntimo, mas também a libertação. A câmera guarda o olhar, a memória congelada do que foi e do que está prestes a mudar. Já as flores vermelhas são o gesto mais emocional e simbólico, um ato de amor próprio e, ao mesmo tempo, de reconciliação com o outro. Escolhi esses objetos porque todos têm uma relação direta com o tema da identidade e da transformação: são coisas simples, mas carregadas de vida interior, como as próprias personagens.
— Gosto muito da música do curta-metragem e nos momentos em que aparece, sempre acontece algo que faz o curta avançar. Como foi a escolha musical?
A música é de autoria da talentosa Marina Alcantud Gaya. Desde o início, eu queria uma composição que permanecesse na mente do espectador. Por isso, a música que Pietra escuta se repete várias vezes, uma melodia popular, simples e hipnótica. Mas tambem cada personagem tem a sua própria musicalidade: Pietra é guiada por uma composição mais contemporânea, vibrante e livre, enquanto Teresa habita um registro mais clássico. Essa oposição sonora acentua o contraste entre as duas e, ao mesmo tempo, revela a harmonia que nasce quando seus mundos finalmente se tocam.
— Pietra e Teresa não falam, mas dizem tudo com gestos e olhares. Que palavra teriam dito uma à outra no início do curta? E no final?
Na primeira versão do curta, as personagens tinham falas, mas em determinado momento percebi que o silêncio dizia muito mais. Decidi então eliminar o diálogo e construir a narrativa apenas através das ações e das emoções. Achei fascinante esse jogo, porque revela o quanto somos capazes de comunicar sem palavras. No fundo, o curta fala sobre aprender a amar, a si mesmo e ao outro. Se Teresa e Pietra dissessem algo no final, talvez fosse apenas um simples “obrigada”. Não por algo concreto, mas por finalmente terem conseguido ver e serem vistas.





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